terça-feira, 11 de outubro de 2016

Despertava as águas


Despertava as águas

 
Despertava as águas o corpo derramava
perdia-se o contorno da pele e habitava a fronteira
do insuspeito. Todas as madrugadas
entorna um copo de água sente azulejos
espreguiçadeiras sem dar-se o nome
ao instante chamado na terceira presença
Nem fosse você nem eu quem acordou
com o nome da boca por onde as fases do rio
enchem ao que sobra arranja no assobio uma música baixinha
a dar vazante, os lábios tremendo tremendo quase desistindo diluindo
a letra esguia de uma carta proibida de um gemido ou ruídos
de alguém chamando repetidamente, os chamados de ajuda
a uma grande explosão. Antes das manhãs
quase sempre os caminhões de lixo e as rádios adotam estações fantasmas
A sala ainda guarda um piano mudo e gavetas inacessíveis
sem reconhecer a noite olhava pela janela um filete de luz
já não reconheceria nem a cidade, ainda bem dentro
saberia da prata de toda lua
somente ao despertar as águas.



 

O mar inteiro dentro da voz soletra sóis e chora como quem derrama cântaros


Na escuta de outros rumores

 

 

 

(o que se faz escuta de outros rumores
se inventa nos sonhos mais antigos).

 
Ao segurar uma lupa confere
Entre sombras essa matéria
De efêmero.

Aproximas aos sinais da terra
O nome a qualquer profecia
De futuro.

 Poderíamos nos agarrar em raios de sol
Vestidos de capas azuis celestes
A estampar em avenidas
Os sons desgarrados

 Entre o saber e o medo, uma saída
Aos abandonados
Aos que silenciam no olhar
O que percebe que entre a relva
Adormecem os sons os sonhos
As selvas e os gestos recolhidos
Por qualquer estação da existência.

Alguém ao longe ecoasse: fosse
Em tempo de colheitas
As semeaduras do estágio
Anterior a fragilidade.

Mas o futuro em flauta
Ascende na andança
Trajado de árabe mouro
Galopando mui eloquente
Desfiando em punho
A espada do destino a lança

Sobre o gesto e dança
O sinal da linguagem
Em consciência onde a palavra
Toma forma e desfaz
Da matéria iniciática

O seu percurso de borboleta
Negra metamorfoseada
Em asas andaluz refletidas
Em azuis, em dois olhos

A aprender a ciência secreta
A sombria névoa dos animais
Desgarrados do bando
Sozinhos, nômades, ao sol.

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